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Quando se entra no complexo labirinto do debate sobre segurança pública, as vozes que ecoam com maior vigor tendem a clamar por um incremento no policiamento e por um rigor mais severo nas penalidades estipuladas pela lei. Contudo, há um aspecto frequentemente deixado de lado nessa discussão acalorada, que demanda um olhar mais minucioso e ponderado.

E quanto àqueles que já cometeram crimes? Aqueles que já foram condenados pelas condutas ilícitas que praticaram? Não há nada que possamos fazer em relação a eles?

Antes de iniciar esta leitura é preciso soltar as pedras que estamos, a todo momento, prestes a arremessar em alguém. É preciso enxergar o outro lado da moeda com menos ânsia de vingança. Claro, não se pode olvidar que muitas vezes aqueles que praticaram o crime foram responsáveis pela morte de um ente querido ou pela subtração de um bem adquirido com tanto suor. Por essa razão, aliás, é tão difícil falar sobre eles. Parece que o ideal é sempre deixá-los escondidos nos locais mais deteriorantes possíveis.

Acontece que se essas pessoas não forem vistas de uma forma mais humanizada, a violência urbana – grande responsável pelas altas taxas de homicídios, furtos e roubos – continuará aumentando.

Diversas pesquisas já foram feitas para mensurar o nível de reincidência criminal no Brasil, entre elas, uma foi muito bem elaborada pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen), que trouxe um número bastante significativo: a medida de referência utilizada pelo Depen demonstrou que no período de 2010 a 2021 42,5% das pessoas que deixaram uma unidade prisional voltaram a ser presas (link).

Tendo em vista que durante esse recorte o Brasil se encontrava com a 3ª maior população carcerária do mundo, em torno de 700.000 pessoas detidas, basta uma análise superficial para reconhecer o quanto o número de reincidentes criminais no país é alarmante.

Portanto, é preciso, sim, focar nesses 40%. É necessário olhar com mais cuidado para as pessoas que já foram condenadas e que se encontram em fase de cumprimento de pena.

Mas, o que fazer? Eis a questão…

A resposta, embora longe de ser simples, começa com um passo fundamental e inequívoco: a estrita adesão aos preceitos da Constituição Federal e da Lei de Execução Penal. Este respeito não é apenas uma questão de legalidade, mas um alicerce para qualquer estratégia eficaz de reabilitação e reintegração social dos ex-detentos.

A Lei nº 7.210/84 (Lei de Execução Penal), por exemplo, estabelece uma série de direitos fundamentais aos condenados, que, embora possam parecer óbvios a ponto de não necessitarem de menção legal, são frequentemente violados na prática. A título exemplificativo, destacam-se o “respeito à integridade física e moral” (art. 40); o direito à “alimentação suficiente” (art. 41, inciso I); e “atribuição de trabalho e sua remuneração” (art. 41, inciso II).

Estes preceitos legais, fundamentais para a manutenção da dignidade humana dentro do sistema prisional, não deveriam ser reduzidos a meras formalidades. Contudo, a triste realidade é que muitas vezes são tratados dessa forma.

Mano Brown, ao compor a canção “Diário de um Detento” (link), capturou uma verdade incontestável. Nem a figura mítica de Lucífer poderia preservar sua integridade moral nas entranhas de uma prisão, onde as condições desumanas prevalecem. Subsistindo à base de uma alimentação deteriorada, marcada pelo “rango azedo“, e lutando contra doenças debilitantes como a “pneumonia“, manter a dignidade torna-se uma proeza quase sobre-humana.

Fato é que enquanto notícias como esta “Tortura em presídios cresce mais de 37%, aponta Pastoral Carcerária” (link); esta “A Violência nas Prisões Brasileiras” (link); esta “STF reconhece cenário de violência massiva de direitos fundamentais no sistema prisional” (link); e muitas outras, fizerem parte dos noticiários, a reincidência criminal nunca irá retroceder.

Enquanto direitos basilares forem diariamente violados dentro dos presídios, garantias fundamentais concedidas a todos (detentos ou não), por exemplo, “à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade” (art. 5º da Constituição Federal) continuarão, lamentavelmente, à mercê da violência urbana.

Portanto, ao debatermos sobre segurança pública, é de suma importância incluir no diálogo aqueles que, por quaisquer que sejam os motivos, cometeram erros.

Alocar recursos na melhoria da infraestrutura dos presídios e na educação dos detentos não deve ser visto, contrariamente ao que muitos acreditam, como um desperdício de recursos financeiros. Pelo contrário, esse investimento seria um passo importante para garantir que a segurança pública se torne progressivamente mais efetiva.

Isso porque promovendo ambientes prisionais mais humanizados e oferecendo oportunidades educacionais aos encarcerados, não apenas contribuímos para a sua reabilitação e reintegração à sociedade, mas também fortalecemos o combate ao aumento da reincidência criminal.

Enfim, o Estado, a sociedade, cada um de nós, não podemos esperar que um problema tão grave seja resolvido sem encará-lo com coragem e despidos de preconceitos.

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Por Gustavo Gasparoto
25 de março de 2024

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