Artigos & Publicações

Por Sérgio Alvarenga

O filme “O Povo contra Larry Flint” é uma entusiasmada ode à liberdade de imprensa.

Dirigido pelo já saudoso Milos Forman (“Um Estranho no Ninho”, “Amadeus”) e com a magnífica atuação de Woody Harrelson (“Assassinos por Natureza”, “Três Anúncios para um Crime”), no papel-título, o filme foi vencedor do Urso de Ouro, no festival de cinema de Berlin.

É a biografia do empresário Larry Flint, que ficou famoso por fundar a revista pornográfica “Hustler”, que ele edita até hoje.

O filme foca, essencialmente, suas batalhas nos Tribunais dos Estados Unidos pelo direito de veicular o que bem desejasse na sua revista: qualquer tipo de obscenidade e, até mesmo, agressivas ofensas e insultos a adversários.

Provocador incorrigível, crítico ácido dos moralistas, Larry Flint colecionou inimigos por meio de charges e “matérias” bastante cruéis contra seus desafetos. Alguns ataques,  verdadeiramente de mau gosto, são espantosos.

Sua agressiva insolência rendeu-lhe incontáveis ações judiciais e, até mesmo, um atentado com consequências trágicas.

Mas, talvez pelo valor da sua luta pela liberdade de expressão; talvez um pouco por compaixão pela sequela do atentado sofrido; talvez muito pela comovente devoção amorosa a sua mulher, interpretada por Courtney Love (sucesso com a banda “Hole”); o espectador afeiçoa-se a figura tão grosseira.

O filme é, sim, um drama. Mas com diversas passagens cômicas. Termina com um final entre o triste, no lado pessoal, e apoteótico, no aspecto da vitória da luta em favor da liberdade.

Eu gosto demais e recomendo!

Uma curiosidade do filme é que o próprio Larry Flint, o biografado, faz uma ponta, representando, sintomaticamente, um juiz que reprime sua incivilidade.

Não por acaso, duas das minhas cenas prediletas do filme são protagonizadas pelo personagem Alan Isaacman, jovem e idealista advogado de Larry Flint. Edward Norton (“As Duas Faces de um Crime”, “A Outra História Americana”) confere dignidade ao competente profissional.

Na primeira dessas cenas, o advogado discursa para um Tribunal popular:

Não estou tentando convencer vocês a gostarem do que Larry Flynt faz. Eu não gosto do que ele faz. Mas do que eu gosto é de viver em um país onde você pode tomar suas decisões sozinho. Eu gosto de viver em um país onde posso comprar a “Hustler” e a ler se eu quiser; ou de joga-la no lixo se eu quiser. Melhor ainda, posso exercer minha opinião e não comprá-la. Eu gosto de ter esse direito. Eu protejo este direito. E vocês deveriam protege-lo também. Porque vivemos num país livre. Dizemos isso muitas vezes, porém muitas vezes nos esquecemos o que realmente isso significa. Então, escutem de novo: “Vivemos em um país livre”. Esse é um importante ideal. E esta é uma forma magnífica de viver. Mas a liberdade tem um preço. Algumas vezes temos que tolerar coisas com as quais nós não concordamos”.

Na outra cena, o advogado lê para o seu cliente uma decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos em seu favor:

Na base da primeira emenda está reconhecida a importância da liberdade de pensamento. A liberdade de expressão é um aspecto da liberdade individual e é essencial na busca da verdade e para a vitalidade da sociedade. No debate de questões púbicas, causas sem motivos admiráveis são protegidas pela primeira emenda”.

Tudo o que deveria ser apenas o óbvio.  Mas que no filme, com a manipulação correta do espectador, fica triunfal!

O filme é de 1996. Retrata fatos ocorridos no final dos anos 70. E é ainda tão atual…