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Nesse artigo, vou tecer considerações sobre a Lei nº 14.811/2024, sancionada no início do ano, que institui medidas de proteção à criança e ao adolescente contra o bullying e o cyberbullying nos estabelecimentos educacionais ou similares. A referida lei acrescentou o art. 146-A ao Código Penal, tipificando a prática do crime de bullying às ações, individuais ou coletivas, de intimidar, de forma reiterada, mediante violência física ou psicológica, uma ou mais pessoas, de modo intencional e repetitivo, sem motivação evidente, por meio de atos de intimidação, humilhação, de discriminação ou de ações verbais, morais, sexuais, sociais, psicológicas, materiais ou virtuais, sendo que o cyberbullying, inserido no parágrafo único do referido artigo, é a prática de intimidação, humilhação, exposição vexatória, perseguição, calúnia e difamação por meio de ambientes virtuais, como redes sociais, e-mail, aplicativos de mensagens. Serão considerados cyberbullying a divulgação de fotografias íntimas e críticas à aparência física, à opinião e ao comportamento social de indivíduos repetitivamente.

Os dois tipos de crime podem ter sérias consequências para os jovens vitimados. Geralmente um quadro inicial de isolamento e tristeza, evoluindo, em alguns casos, para sérios sintomas de depressão, síndrome do pânico ou transtorno de ansiedade. Nos exemplos mais extremos, a vítima tenta cometer o suicídio, o que muitas vezes se efetiva. O cyberbullying ultrapassa qualquer fronteira física, tirando da vítima qualquer possibilidade de escapar dos ataques, que acontecem o tempo todo por meio das redes sociais e dos aplicativos de mensagens. O agressor, em regra, aproveita-se do anonimato e, de forma covarde, ataca as vítimas, deixando-as impossibilitadas de se defenderem.

Deve-se destacar a necessidade de regulamentação dessas plataformas digitais, buscando impedir o seu uso por pessoas com idade inferior à permitida. Poucos sabem, ou não se atentam, mas o aplicativo WhatsApp, por exemplo, não permite o registro de contas para pessoas com menos de 13 anos, podendo fazê-lo se os pais ou responsáveis assinarem o termo de uso. Entendo, assim, que eles deveriam ser diretamente responsabilizados por atos criminosos de seus filhos na utilização dessas plataformas.

Segundo dados da Pesquisa Nacional de Saúde Escolar e do IBGE, mais de 40% dos estudantes, adolescentes brasileiros, são vítimas de bullying no ambiente escolar. É bom destacar que a preocupação, o sofrimento e a angústia com o crescimento dessa prática não se limitam ao meio estudantil, mas estão crescendo na sociedade como um todo, notadamente entre os jovens. De acordo com outra pesquisa, do Instituto Ipsos, o Brasil é o segundo país que registra o maior número de casos de bullying e cyberbullying, atrás apenas da Índia.

Nesse tipo de crime, em regra, os agressores usam perfis falsos (fakes), acreditando estarem totalmente protegidos quanto à sua identidade real, ou simplesmente se manifestam pelo meio virtual para não terem que encarar a sua vítima pessoalmente. A inclusão de bullying e cyberbullying no CP significa uma relevante atualização da legislação pátria, para acompanhar as alterações dinâmicas da sociedade, que há tempos demonstra não saber lidar de forma satisfatória com medidas preventivas e educacionais para diminuir a incidência dos atos agora criminalizados.

Contudo, entendo que o endurecimento das regras não irá, por si só, resultar necessariamente em uma mudança de comportamento daqueles que praticam bullying e cyberbullying, porque o Direito Penal nunca será a única ferramenta de combate desses atos, e sim um auxílio a políticas educacionais e comportamentais de respeito e empatia ao próximo. Não podemos nos esquecer de que muitos dos autores de bullying também são crianças e adolescentes, que podem acabar sendo estigmatizados por sanções judiciais, levando a um efeito oposto ao pretendido.

A conscientização é a grande ferramenta para prevenir esses comportamentos prejudiciais ao indivíduo isoladamente, mas também ao convívio social como um todo. Devemos encorajar a denúncia e a busca por ajuda, além de promover debates sobre como combater essas práticas de maneira efetiva. Enquanto cidadãos, todos nós temos uma responsabilidade compartilhada no combate a esse tipo de prática, que, de forma vil e covarde, atinge crianças e adolescentes.

A união de forças para educar, informar e promover a empatia, construindo uma cultura de respeito e inclusão, é uma importante ferramenta no combate a essas práticas criminosas, com consequências nefastas não somente para a saúde mental e psicológica de nossos cidadãos, como também para a produtividade de modo geral de toda a comunidade social.

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Renata Mariz de Oliveira
06 de maio de 2024